CONTEÚDO PARA LICITANTES

Foto de Dr. Wussander Camello

Dr. Wussander Camello

Empresário, Professor, Palestrante e Advogado especialista em licitações públicas.

Introdução

Sempre que nos deparamos com um instrumento convocatório, no nosso caso o mais famoso é o edital de licitação, estamos diante de um documento formal que inicia a fase externa da licitação.

Veja, antes de chegar ao edital uma equipe se debruçou sobre uma demanda do órgão e cumpriu uma sequência de fases produzindo artefatos e discutindo qual a melhor solução para a citada demanda.

O que quero dizer é que antes do edital pessoas (equipe de planejamento da contratação) receberam uma demanda (necessidade do órgão) e fizeram estudos (Estudos Técnicos Preliminares) analisando os riscos (mapas de riscos) até encontrar uma solução e descrevê-la minuciosamente (Termo de Referência) para ai sim o edital ser lançado “na praça”.

O dilema, porém, é de que se trata de pessoas o que é muito bom e muito ruim ao mesmo tempo, já que pessoas tem o poder de proporem soluções nunca antes pensadas e ao mesmo tempo pessoas erram!

Pensando nisso precisamos entender que o edital não é um documento sagrado imaculado que precisa ser adorado e respeitado incondicionalmente, muito pelo contrário, o edital e seus anexos precisam ser amplamente verificados, conferidos e por isso existem prazos e instrumentos legais para questionarmos este instrumento.

Todo edital é passível de erros, incoerências, ambiguidades e até mesmo de agentes mal intencionados que podem incluir no edital requisitos ilegais visando beneficiar um determinado grupo de empresas ou pessoas, mas o legislador atento a isso disponibilizou para a sociedade ferramentas para conferir e questionar.

Esclarecimentos e impugnações (sob a Lei 14.133/2021):

Cabe aqui breves comentários a respeito da diferença dos instrumentos.

Esclarecimentos:

São a forma mais prática e formal de tirar dúvidas. Como dito, um edital possui uma infinidade de detalhes técnicos e a depender do objeto a ser licitado muitas dúvidas podem surgir na hora de fazer a composição do seu preço, por isso, todo edital precisa trazer consigo um canal, normalmente e-mail, onde o licitante poderá fazer questionamentos sobre eventuais dúvidas.

Exemplo de dúvidas que podem gerar pedidos de esclarecimento:

“Qual é o prazo correto para entrega dos produtos?”

“Pode uma empresa em consórcio apresentar atestado em nome de apenas um dos consorciados?”

“O critério de julgamento será por menor preço global ou por item?”

Outro detalhe é que qualquer pessoa, física ou jurídica poderá pedir esclarecimentos, conforme leciona o Art. 164 da nova lei de licitações, vejamos:

Antes da publicação do edital para que as empresas apresentem suas propostas o órgão possui uma série de procedimentos internos a serem respeitados, estes procedimentos visam garantir a legalidade e necessidade da administração para aquela contratação, bem como a garantia de que existem recursos para pagar por aquele custo, a nova lei também determinou quais são os procedimentos da fase interna, vejamos:

Art. 164. Qualquer pessoa é parte legítima para impugnar edital de licitação por irregularidade na aplicação desta Lei ou para solicitar esclarecimento sobre os seus termos, devendo protocolar o pedido até 3 (três) dias úteis antes da data de abertura do certame.

Parágrafo único. A resposta à impugnação ou ao pedido de esclarecimento será divulgada em sítio eletrônico oficial no prazo de até 3 (três) dias úteis, limitado ao último dia útil anterior à data da abertura do certame.

É preciso, porém, se atentar aos requisitos formais do pedido de esclarecimento, entre eles o prazo que deve ser de pelo menos 3 (três) dias úteis antes da data de abertura do certame.

Impugnação

Enquanto o esclarecimento visa tirar dúvidas a impugnação visa discordar, questionar e solicitar mudanças no edital. Isso mesmo, qualquer pessoa é parte legítima para identificar ilegalidade, irregularidade ou restrição indevida à competitividade em um edital e impugná-lo, exigindo que a administração altere-o para atender aos princípios, leis e regras de licitação.

O prazo é o mesmo do dos esclarecimentos positivados no Art. 164 da LEI 14.133/2021, vamos a alguns exemplos passíveis de impugnação:

EXEMPLO 1 – Exigência desproporcional de atestados de capacidade técnica, o edital exige apresentação de atestado de capacidade técnica com execução anterior de 100% do objeto licitado, o que restringe a competitividade.

A impugnação seria no sentido de requerer a revisão da exigência contida no item X do edital, que determina a apresentação de atestado de capacidade técnica com comprovação de execução integral do objeto, por entender-se desarrazoada e em desacordo com os princípios da proporcionalidade e da ampla competitividade previstos na Lei 14.133/2021.

EXEMPLO 2 – Exigência de marca específica sem justificativa técnica, o suposto edital menciona uma marca de produto sem permitir equivalência, o que fere o princípio da isonomia.

A impugnação seria em desfavor da cláusula que restringe o fornecimento ao equipamento da marca XYZ, sem apresentação de justificativa técnica ou autorização excepcional, em afronta ao art. 7º, §5º da Lei 8.666/93 (ou art. 46 da Lei 14.133/21), que proíbe a indicação de marcas salvo em casos devidamente fundamentados.

EXEMPLO 3 – Os prazos estabelecidos no edital para entrega dos produtos ou início da execução contratual é incompatível com a realidade do mercado, logo a impugnação seria: O prazo de 5 dias corridos para entrega dos itens após a assinatura do contrato revela-se insuficiente, desconsiderando prazos logísticos usuais e prejudicando a ampla participação de licitantes, configurando restrição à competitividade.

Considerando que cada edital é um instrumento único, elaborado por pessoas únicas em momentos específicos do tempo seria impossível elencar todas as possibilidades de impugnação, todavia, acredito que a ideia do que seja impugnação restou clara.

Quando representar nos Tribunais de Contas e judiciário?

Considerando que trata-se de ato administrativo passível de correção pelo próprio órgão o primeiro meio de solução será aquele indicado no edital, logo o próprio órgão contratante e somente depois, caso a ilegalidade continue é que se deve buscar representações nos tribunais de contas ou judiciário.

Neste sentido decidiu o TCU no Acórdão 10038/2023-TCU-Plenário:

[Enunciado] O interessado em questionar eventuais irregularidades em processo licitatório deve acionar inicialmente o órgão ou a entidade promotora do certame, e somente após, se necessário, ingressar com representação no TCU, a fim de evitar duplicação de esforços de apuração em desfavor do erário e do interesse público, considerando o princípio constitucional da eficiência e as disposições do art. 169 da Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos).

Também no Acórdão 1882/2022-TCU-Plenário:

1.7.1. informar à representante que, considerando o princípio da eficiência insculpido no art. 37 da Constituição Federal e as disposições previstas no art. 169 da Lei 14.133/2021, deve acionar inicialmente a primeira e a segunda linhas de defesa, no âmbito do próprio órgão/entidade, antes do ingresso junto à terceira linha de defesa, constituída pelo órgão central de controle interno e tribunais de contas, sob pena de poder acarretar duplos esforços de apuração, em desfavor do erário e do interesse público, conforme entendimento deste Tribunal (Acórdãos/Plenário 572/2022, rel. Ministro Vital do Rêgo; 1.061/2022, rel. Ministro Aroldo Cedraz; 1.089/2022, rel. Ministro Antônio Anastasia; e 1.123/2022, rel. Ministro Aroldo Cedraz).

Apenas para registro, em outras diversas vezes a orientação seguiu o mesmo sentido, quais sejam: Acórdão 1805/2022-TCU-Plenário, Acórdão 1123/2022-TCU-Plenário, Acórdão 1089/2022-TCU-Plenário, Acórdão 1061/2022-TCU-Plenário, Acórdão 572/2022-TCU-Plenário

Onde o órgão deve responder?

Em atenção ao princípio da transparência todas as impugnações e esclarecimentos devem ser respondidos publicamente, e com o advento do Portal Nacional de Compras Públicas – PNCP, devem ser disponibilizados nele.

Assim entende o TCU, conforme Acórdão 911/2024-TCU-Plenário onde foi orientado ao órgão:

1.6.1. dar ciência à [omissis], com fundamento no art. 9º, inciso I, da Resolução TCU 315/2020, sobre as seguintes impropriedades/falhas, identificadas no Pregão Eletrônico 90003/2024, para que sejam adotadas medidas internas com vistas à prevenção de outras ocorrências semelhantes: […] 1.6.1.2. falta de publicação no sistema Compras.gov.br da impugnação apresentada pela licitante [omissis] e da resposta do pregoeiro, em afronta ao princípio da publicidade, ao subitem 10.2 do edital e ao parágrafo único do art. 164 da Lei 14.133/2021.

Também neste sentido, Acórdão 1806/2020-TCU-Plenário:

c) dar ciência ao [omissis] de que a ausência do registro de impugnação ao edital do Pregão Eletrônico [omissis], no sistema que operacionaliza o pregão no Portal de Compras Governamentais, afronta o princípio da publicidade insculpido na seguinte legislação: art. 37, caput, da Constituição Federal; art. 3º, caput, da Lei 8.666/1993; e art. 2º, caput, do Decreto 10.024/2019, bem como dificulta o controle social preconizado no § 1º do art. 113 da Lei 8.666/1993, além de contrariar o previsto no manual do pregoeiro, desenvolvido pelo então Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão;

Logo, até um dia útil antes da abertura do processo, o agente de contratação deve disponibiliza sua decisão e respostas e caso não o faça a abertura do certame precisa ser adiada.

A licitação precisa ser remarcada em caso de alteração no edital?

Caso haja alterações no edital, principalmente em casos onde as alterações impactem a formulação da proposta os prazos precisam ser reiniciados e o certame remarcado, vejamos a inteligência do Acórdão 2898/2012-TCU-Plenário:

[Enunciado] Qualquer modificação dos critérios inicialmente fixados no ato convocatório exige divulgação pela mesma forma que se deu o texto original, reabrindo-se o prazo inicialmente estabelecido, exceto quando, inquestionavelmente, a alteração não afetar a formulação das propostas.

Também o Acórdão 157/2012-TCU-Plenário:

[Enunciado] Devem ser reabertos os prazos estabelecidos em edital sempre que modificadas as condições de formulação das propostas, quer por acréscimo, alteração ou supressão de cláusulas diretamente no edital, quer pela divulgação de retificação ou interpretação que possa alterar a percepção dos potenciais interessados acerca de comandos contidos no instrumento convocatório e seus anexos.

Assim sendo, restam tratados os principais pontos sobre impugnações e esclarecimentos no tocante aos processos licitatórios.

Como impugnar ou pedir esclarecimentos em uma licitação

Este conteúdo foi útil? Compartilhe com alguém.

Posts Recentes

plugins premium WordPress